sábado, 10 de novembro de 2007

Descompasso entre universidade e mercado

O núcleo de pesquisas do Observatório Universitário da Universidade Candido Mendes, do Rio de Janeiro, realizou um estudo inédito que aborda dois aspectos importantes da relação entre cursos superiores e mercado de trabalho: a crença na soberania do mercado enquanto determinante do sucesso profissional e retorno financeiro satisfatório e a desproporção da oferta de determinados cursos superiores, desvinculada da demanda do mercado de trabalho e da necessidade deles para o desenvolvimento do País.

Administração de empresas e direito são cursos que lideram o ranking brasileiro em número de alunos matriculados, correspondendo ao percentual aproximado de 30% do universo dos estudantes do ensino superior. No entanto, a pesquisa demonstra alto índice de desemprego entre os graduados. Do total de 665.409 bacharéis em direito, registrados pelo Censo 2000 do IBGE, 25% não estavam trabalhando. Entre aqueles que trabalhavam, apenas 51,3% atuavam na área. Os dados evidenciam, ainda, a precariedade da formação da maioria dos concluintes e a elevada concorrência entre os profissionais.

No último exame realizado pela OAB de São Paulo – onde estão 23% do total de curso de direito do País -, dos 18 mil inscritos, apenas 18,32% foram aprovados. No Brasil, há um advogado atuante para cada 398 habitantes. Proporção superior à da maioria dos países europeus. Na França existe um advogado para 1.460 habitantes. Na Alemanha, um para 680; e na Itália, um para 444.

Para os jovens e seus pais, o curso de direito representa garantia de emprego e de retorno financeiro. É inegável que a globalização, o exercício da democracia e a consciência dos direitos do cidadão ampliaram os espaços de atuação desse profissional. Hoje, convocado a intermediar relações das mais diversas esferas: familiar, comercial, trabalhista, internacional, criminal etc. Soma-se a esse cenário, a interdisciplinaridade do conhecimento que gera novas áreas de atuação ao exigirem regulamentação jurídica, como direito de propriedade intelectual, direito ambiental, biodireito, dentre outras.

Mas é preciso não desconsiderar o fato de que para ter êxito em direito, ou em qualquer profissão, é fundamental haver identificação. Além de, especialmente no caso dessa profissão, serem necessários anos de investimento sem retorno financeiro imediato e adoção de estratégias eficazes para fazer frente à concorrência. Priorizar apenas o mercado de trabalho, portanto, pode ser uma armadilha.

Entre os graduados em administração de empresas, a realidade não é diferente. Dos 651.310 concluintes, também contados pelo Censo 2000 do IBGE, 20% não estavam trabalhando. Segundo analistas, o motivo do crescimento desordenado desses cursos é por serem menos dispendiosos, na medida em que podem ser ministrados essencialmente com aulas expositivas. Não exigem laboratórios, nem equipamentos caros. Além de serem valorizados e considerados úteis em vários setores de atividade. Este é um problema que afeta a esfera educacional e atinge qualquer País que pretenda se tornar competitivo numa era de acelerada inovação tecnológica.

O caso do Brasil é muito significativo. Enquanto os jovens correm para as ciências humanas, existe escassez de especialistas no campo das engenharias e das ciências naturais, nas quais se encontram apenas 7,6% dos estudantes universitários. Enquanto nos 30 países da Organização de Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), esse percentual é de 15,5%, segundo Roberto Lobo , consultor em gestão educacional e ex-reitor da USP.

É verdade que o ambiente político-econômico do País, nas últimas décadas, não tem sido acolhedor para os profissionais dessas áreas. O baixo investimento em infra-estrutura produziu retração do mercado para os engenheiros. Do mesmo modo que, a redução de verbas para as universidades, principal celeiro de desenvolvimento de pesquisa do país, inibiu a procura pelas ciências naturais.

Essa situação evidencia a ineficiência do modelo do desenvolvimento nacional, especialmente no que se refere à necessária vinculação entre o planejamento estratégico do país e a educação. Porém, apesar dessa realidade, algumas ações podem indicar mudanças. A liberação de recursos feita pelos Ministérios da Ciência e da Tecnologia e da Saúde destinadas ao investimento em pesquisas, como das células-tronco, incrementará a formação de pesquisadores e de cientistas.

Em Pernambuco, os projetos estruturais da refinaria de petróleo e do estaleiro naval da Camargo Corrêa, entre outros planejados, como o pólo de poliéster, a retomada da Transnordestina e a transposição do São Francisco. Todos expandirão o mercado para as engenharias e áreas técnicas afins.